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segunda-feira, 23 de junho de 2025

 O Legado das avós


Naquela tarde quente de sábado, o sol caía manso, dourando as folhas das mangueiras e espalhando sombras que dançavam no asfalto da rua. Marcos andava devagar, segurando firme a mão pequena do seu filho Leo, um menino sapeca de cinco anos, cheio de vida e curiosidade. Leo pulava, corria, apontava para tudo — um pombo que voava, um carro colorido, uma folha que rodopiava no vento. O mundo, para ele, era um grande terreiro de festa e descobertas.

Do outro lado da rua, caminhava uma senhora de cabelos brancos, ereta como um coqueiro velho, segurando a mão da neta Sofia, menina da mesma idade de Leo, com um laço rosa no cabelo e olhos brilhando de curiosidade. As duas crianças, tão parecidas na inocência, se encontraram no meio do caminho.

Leo largou a mão do pai para se agachar e observar uma fila de formigas que trabalhavam como se o mundo dependesse delas. Sofia, vendo a mesma maravilha, soltou a mão da avó e se juntou a ele, sem dizer uma palavra. O silêncio virou cumplicidade, um dedo apontado, um sorriso tímido, e logo as risadas brotavam, como água fresca na boca da gente. Eles começaram a correr, a brincar, a girar em roda, numa ciranda que não precisava de fala, só de alegria. Ali não existia cor, nem raça, nem passado — só a leveza do presente, o encanto de uma amizade nascendo.

Marcos olhava aquilo tudo com um sorriso que apertava o peito, sentindo a pureza da infância, a esperança que ainda teima em brotar no meio da dureza da vida. Ele trocou um olhar com a avó da menina, esperando ver no rosto dela o mesmo brilho, o mesmo encanto. Mas o rosto da velha era fechado, duro, como pedra de moinho.

A brincadeira, que parecia eterna, foi interrompida pela voz cortante da senhora, seca e fria como a brisa do mar no inverno:
“Vem, Sofia. Chega.”

Sofia parou, ofegante, com o sorriso ainda nos lábios, olhando para a avó sem entender a pressa. Leo parou também, esperando que a roda girasse de novo, que a festa continuasse.

Mas a avó não deu chance. Com a naturalidade cruel de quem não vê maldade no que diz, soltou a frase que cortou o tempo e congelou o ar:
“Deixa aí o negrinho e vamos.”

A palavra caiu pesada, como uma pedra no meio do caminho. “Negrinho.” Um nome que, naquela boca, era uma sentença, um muro invisível, uma porta fechada na cara da inocência. O sorriso de Leo murchou, e seu corpo pequeno ficou tenso, como se tivesse levado um soco no peito. Ele olhou para o pai, com olhos grandes, pedindo ajuda, uma explicação para aquela rejeição que ele não sabia entender.

Sofia franziu o cenho, puxada pela mão da avó, e olhou para trás, para o amigo que, num instante, virou estranho, virou proibido, virou o que não devia mais ser visto. A brincadeira acabou, a pureza se quebrou.

Ali, naquela calçada quente e cheia de vida, o racismo se mostrou nu e cru. Não era um monstro distante, mas uma velha senhora, de cabelos brancos, que carregava no peito um veneno antigo e passava adiante, como quem planta uma semente amarga no solo fértil da infância.

Enquanto se afastavam, a senhora deixava para trás não só um menino confuso e um pai com o coração apertado de tristeza e raiva, mas um legado sombrio: o ódio que se ensina, que se herda, que se repete — uma sombra que insiste em perseguir as novas gerações.

Redator Gemini 2.5 Pro Think